A relatividade das fontes de energia

A evolução das exigências ambientais e a possibilidade de integração dos projetos de usinas eólicas com culturas agropecuárias são alternativas na mesma direção 

O Brasil ocupa um papel estratégico na transição energética global graças principalmente à qualidade das suas matrizes energética e elétrica, além do potencial ainda inexplorado de fontes renováveis.  Essas características devem ser valorizadas e aproveitadas, tendo em vista a importância de o país evoluir para uma economia com baixas emissões de carbono em meio à urgência das mudanças climáticas.  

Essa condição também pode refletir no desenvolvimento socioeconômico do país, uma vez que nos permite ampliar a atuação no comércio internacional por meio da fabricação dos produtos descarbonizados dos quais boa parte do mundo precisa para cumprir as metas do Acordo de Paris, mas não tem como produzir justamente pela falta de recursos renováveis.  

A disponibilidade de minerais críticos e nossas condições geográficas e de infraestrutura também são, de maneira geral, pontos a nosso favor.  Mas, apesar dessas vantagens do país na corrida contra as mudanças climáticas, os impactos ambientais das fontes de energia vão muito além de emitirem ou não gases de efeito estufa: ainda não se descobriu alguma que supere a regra clássica da economia informal de que não existe almoço grátis.  

Por exemplo, as grandes hidrelétricas com reservatórios, hoje fundamentais para a continuidade do fornecimento de energia elétrica em meio às oscilações das usinas eólicas e solares, exigiram o alagamento de áreas imensas, com perdas extremamente relevantes para a flora e a fauna brasileiras.   Os biocombustíveis, que se destacam pelo fato de as emissões de carbono de sua queima serem compensadas durante o crescimento das plantas usadas na sua produção, comportam todos os problemas das monoculturas agrícolas: o uso excessivo de território e água, a dependência de fertilizantes em sua maioria produzidos a partir de gás natural e o uso de diesel no maquinário das fazendas, entre outros.   

Já no caso das “novas” renováveis, as questões vão do risco de aumento da desertificação em áreas da caatinga à necessidade de serem complementadas por geração térmica que, assim como as grandes hidrelétricas, é usada para “firmar” o seu funcionamento.  Nos últimos anos, a legislação e a fiscalização ambiental têm sido aperfeiçoadas para reduzir tais impactos. O exemplo mais significativo nesse sentido foram os limites impostos aos reservatórios das hidrelétricas, ainda nos anos 2000.  

O aumento da eficiência nos cultivos, a possibilidade de uso de fertilizantes produzidos com hidrogênio de baixas emissões, a adoção de biogás (gerado a partir de resíduos agrícolas das próprias fazendas) e o controle do desmatamento são alternativas para contornar, pelo menos parcialmente, os problemas por trás do etanol e biodiesel.   

A evolução das exigências ambientais e a possibilidade de integração dos projetos de usinas eólicas com culturas agropecuárias são alternativas na mesma direção. Já no que diz respeito às fontes fósseis, o efeito estufa é tão relevante entre suas consequências negativas que hoje praticamente não são abordados seus impactos diretos em termos de saúde pública e destruição de ecossistemas.    

Existem alternativas para reverter essas emissões? A captura e o armazenamento de carbono são a principal promessa do setor de óleo e gás. Mas, por enquanto, essas frentes se limitam a projetos  experimentais, com custos excessivos e vinculados justamente ao aumento da produção (e das correspondentes emissões no uso desses energéticos), e não o contrário.  Os benefícios proporcionados pelas fontes renováveis de energia em termos de mudanças climáticas e vantagens econômicas não as eximem de outros impactos ambientais, que precisam ser fiscalizados, evitados e combatidos. 

Mas, em termos de transição para o baixo carbono e da emergência em que vivemos, é inegável que sejam as melhores opções. Quanto às fontes fósseis, a direção virtuosa passa por uma paulatina redução da dependência, por meio de um phase out que fortaleça a posição do Brasil como potência global da economia verde. 

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