Rosana Santos*
A afirmação de Donald Trump de que a energia eólica não é econômica sem subsídios nos Estados Unidos não é desprovida de razão. O Departamento de Energia do país indica que, sem eles, a energia de novos parques custa mais do que a de usinas a gás natural.
A qualidade dos ventos brasileiros, no entanto, torna absurda qualquer tentativa de tropicalização desse discurso. Enquanto o fator de capacidade médio das eólicas norte-americanas é de 33%, aqui no Brasil passa de 50%. Ou seja, o custo médio de um MWh da fonte gerado aqui equivale a pouco mais da metade daquele dos EUA.
Além disso, as estimativas não levam em conta o custo da energia necessária para complementar a oferta variável da eólica. Enquanto o acompanhamento de carga nos EUA tem de ser feito com térmicas, aqui a função em geral é de hidrelétricas que, além de mais baratas, são renováveis.
Temos de seguir os efeitos das recentes decisões do novo governo americano sobre a retirada de apoio às políticas implantadas por meio do Inflation Reduction Act (IRA) e outros atos. Talvez não sejam tão expeditas as mudanças nos planos de investimento em fontes limpas de energia, uma vez que afetariam comunidades apoiadoras do novo governo. Como mostrou artigo no Valor Econômico, cerca de 85% dos investimentos (somando US$ 107 bilhões) e 68% dos empregos diretos criados pelo programa beneficiaram distritos representados pelo Partido Republicano.
De qualquer forma, a constatação da menor eficiência das eólicas nos EUA combinada à ambição fóssil trumpista amplia a responsabilidade de países como o Brasil no contexto das mudanças climáticas, por poder contribuir de maneira mais eficiente em favor da descarbonização.
A vantagem é que essa responsabilidade vem acompanhada por benefícios econômicos importantes: nossa energia limpa é uma alternativa mais barata de descarbonização de cadeias produtivas internacionais. Uma vez exportados, produtos brasileiros ajudam outros países a cumprirem suas metas climáticas e proporcionam ganhos superiores à nossa economia do que a venda de bens primários.
As intenções dos EUA em relação à pauta climática são muito preocupantes, a começar pela saída do Acordo de Paris. Por ora, é torcer para que a racionalidade econômica e a urgência climática se imponham acima de ideologia ou de discursos e promessas inaugurais. Ao mesmo tempo, vamos trabalhar com ainda mais afinco para ocuparmos espaço entre os protagonistas desse tema, um papel sob medida para as nossas condições e para a nossa ambição de desenvolvimento.
* Rosana Santos é diretora-executiva do Instituto E+ Transição Energética.