A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) anunciou, no início deste mês, que 327 projetos, somando 74 GW, se cadastraram para participar no Leilão Reserva de Capacidade de 2025, previsto para ocorrer em 27 de junho de 2025. Desse total, 67% se referem a usinas termelétricas novas a gás natural, 30% termelétricas existentes e 3% são projetos de ampliação de hidrelétricas.
Considerando que o principal requisito a ser atendido por meio desse leilão é o aumento de flexibilidade do sistema, o Instituto E+ vê com preocupação essa participação significativa de usinas a gás no certame, uma vez que o país dispõe de opções com custos e impactos ambientais inferiores.
Nesse sentido, merece destaque justamente o fato de que o governo também está preparando o primeiro leilão de contratação de baterias, uma alternativa menos poluente para aumentar a flexibilidade do sistema. Uma gestão mais inteligente das hidrelétricas com reservatórios e a resposta da demanda são outras possibilidades.
Confira algumas perguntas e respostas sobre o assunto preparadas pelo diretor do E+ Clauber Leite e a assistente técnica Karine Bruno:
1) É necessário contratar térmicas enquanto não há uma estrutura de armazenamento em escala no país?
A necessidade de térmicas não pode ser analisada como uma escolha binária entre “ter ou não ter” usinas fósseis. Há um conjunto de soluções que podem reduzir essa dependência, como resposta da demanda, correto uso dos reservatórios hidrelétricos e investimentos em baterias. Como mostra a experiência internacional, sistemas elétricos podem ser mais resilientes sem depender exclusivamente de térmicas.
Além disso, as térmicas contratadas no modelo atual, muitas vezes de forma compulsória, têm longas curvas de rampa (o que aumenta seu custo para despacho por poucas horas), custo superior ao de outras opções e impacto ambiental significativo, sem garantir a melhor eficiência para o sistema. Na verdade, os leilões do setor elétrico e o necessário redesenho do mercado deveriam priorizar mecanismos mais modernos, flexíveis e eficientes.
2) Como o sistema pode atender a demanda por energia quando as usinas solares e eólicas não produzem?
A resposta não passa exclusivamente pela contratação de térmicas. Existem outras estratégias, como:
- Resposta da demanda: incentivos para consumidores reduzirem ou deslocarem consumo nos momentos de maior necessidade. Essa estratégia já é aplicada com sucesso em países como Austrália e Nova Zelândia, bem como no mercado PGM, dos EUA.
- Gestão inteligente dos reservatórios hidrelétricos: uso das hidrelétricas para o seguimento de carga, reduzindo o curtailment e a necessidade de acionamento térmico.
- Armazenamento com baterias: o custo das baterias está em queda e sua aplicação pode reduzir a intermitência das fontes renováveis, proporcionando mais flexibilidade ao sistema.
A combinação dessas soluções permitiria uma matriz mais equilibrada e sustentável, sem criar uma dependência artificial de térmicas mais caras e poluentes.
3) As baterias são um sonho distante ou já podem ser consideradas algo palpável?
O Ministério de Minas e Energia (MME) deve realizar o primeiro leilão de baterias de armazenamento no segundo semestre de 2025. A expectativa é que esses projetos fortaleçam a resiliência do sistema elétrico e integrem fontes renováveis de maneira mais eficaz.
A iniciativa é uma demonstração de que as baterias não são mais um conceito futurista. Nesse sentido, também merece destaque o fato de que o Brasil já conta com projetos-piloto demonstrando sua viabilidade técnica e econômica, como a instalação da Isa-CTEEP em Registro – SP, que funciona como um reforço à rede em momentos de pico de demanda no litoral sul do estado. Em mercados mais maduros, como Estados Unidos e Austrália, as baterias vêm sendo utilizadas para substituir térmicas a gás nessas situações.
No entanto, é importante destacar que baterias não são a solução para todos os casos. Seu uso é mais adequado para aplicações específicas, como o gerenciamento de picos de consumo e o deslocamento da geração renovável para horários de maior demanda. Para necessidades de suprimento de longa duração ou períodos prolongados sem geração de energia renovável, soluções como a resposta da demanda e a melhor gestão dos reservatórios podem ser mais eficientes e econômicas.
4) Qual o volume de investimentos previstos nesse segmento?
As projeções de investimentos no setor de armazenamento de energia no Brasil ainda variam bastante, dependendo da fonte consultada. Algumas estimativas indicam que o mercado pode movimentar entre R$ 22,5 bilhões, segundo a Greener, e R$ 44 bilhões, segundo a Associação Brasileira de Soluções de Armazenamento de Energia (ABSAE), até 2030, dependendo do tipo de tecnologia e aplicação.
É importante frisar que essas organizações têm interesses diretos na expansão desse mercado. Por isso, é fundamental contar com estudos mais robustos e dados oficiais para embasar decisões estratégicas e políticas públicas sobre o papel do armazenamento no sistema elétrico.
De qualquer forma, já está claro que há um interesse crescente pelo tema, e o primeiro leilão para agregar baterias ao setor elétrico brasileiro deve atrair investimentos significativos. No entanto, para dimensionar melhor o potencial real dessa tecnologia no Brasil, é necessário um acompanhamento mais detalhado do seu custo-benefício em diferentes aplicações.