Rosana Santos*
O uso de eletricidade de fonte renovável garante ao Porto de Santos um padrão de sustentabilidade superior ao de portos semelhantes no resto do mundo, tendo em vista que conta com uma pequena central hidrelétrica praticamente exclusiva para o seu abastecimento. Agora, a perspectiva é ampliar essa contribuição em favor da mitigação das mudanças climáticas, por meio da produção de hidrogênio de baixas emissões de carbono. Mas é possível ir muito além, com a neoindustrialização verde do país.
Como detalhado aqui no jornal A Tribuna, a perspectiva da Autoridade Portuária de Santos (APS) é terceirizar a administração do complexo de Itatinga – onde se encontra a usina – à iniciativa privada, por meio de parceria público-privada (PPP). A principal ação nesse sentido diz respeito à expansão da hidrelétrica de 15 MW e a instalação de uma unidade de produção de hidrogênio associada. O investimento previsto especificamente nessa planta é estimado em R$ 500 milhões.
A perspectiva é que o hidrogênio fabricado no local seja transformado em amônia para ser exportado. Deve contribuir para o atendimento, portanto, da demanda crescente pelo energético limpo que, ao lado da eletrificação de processos, é visto como a principal rota de descarbonização de países cujas matrizes energéticas são fortemente dependentes de combustíveis fósseis.
A contribuição do Brasil para a descarbonização global pode, no entanto, ir muito além da exportação de hidrogênio. A qualidade ambiental da nossa matriz energética e o potencial de fontes renováveis de energia não explorado credenciam o país para se tornar um grande hub de fabricação de produtos com baixas emissões de carbono.
Na siderurgia, por exemplo, isso passa pela tecnologia de substituição do carvão mineral por hidrogênio renovável, carvão vegetal sustentável ou mesmo biometano, eletrificação, até mesmo ações de eficiência de processos. Trocas semelhantes podem ser feitas nos setores químico, vidreiro e alimentício, entre outros, além da produção de biocombustíveis para navios e aviões.
Isso pode contribuir não só para a descarbonização do país, mas garantir a oferta, pelo Brasil, de produtos “verdes” para apoiar outras nações no cumprimento de suas metas de redução de emissões. Trata-se, portanto, de um processo que tem tudo para fortalecer nosso comércio internacional, no qual a infraestrutura portuária será um dos protagonistas.
Evidentemente que transformar esse plano em realidade requer a superação de inúmeros desafios, como investimentos na oferta de energéticos limpos e no parque industrial, conquista de mercados e a disponibilidade de infraestrutura adequada para viabilizá-la. Nesse contexto, o interesse da Autoridade Portuária por contribuir na transição energética é muito bem-vindo, mas irá muito além: a sustentabilidade pela qual o porto anseia também passará pelo porto.
* Rosana Santos é diretora-executiva do Instituto E+ Transição Energética; artigo originalmente publicado no jornal A Tribuna.