COP30, a hora de agir* 

Rosana Santos** 

Quando a maioria de nós ouviu falar em mudanças climáticas pela primeira vez, provavelmente pensou que se tratasse de algo que afetaria nossos netos ou mesmo bisnetos, numa escala de tempo que nos dava margem para não nos preocuparmos muito com o assunto. Mais recentemente, essa escala diminuiu, como algo que certamente causaria problemas também para a geração dos nossos filhos. Agora, a urgência bate à porta, num cenário cujas piores previsões começam a se confirmar. 

Depois de 2024 ter sido marcado como o ano mais quente da história, o mês de janeiro já ocupou novo recorde. Os efeitos dessa situação não estão apenas em eventos climáticos extremos em geografias distantes – como os incêndios que destruíram imensas áreas na Califórnia nas últimas semanas –, mas também bem próximos de nós – nas ondas de calor registradas na região Sul do Brasil e em países vizinhos, na transformação das tradicionais chuvas de verão em violentas tempestades, e em previsões cada vez mais preocupantes sobre a variação do nível do mar.  

Como detalha reportagem publicada no início da semana nesta Tribuna, a perspectiva é que essa variação impacte cerca de 2 milhões de brasileiros nos próximos anos. De acordo com estudo da Climate Central – organização sem fins lucrativos dos Estados Unidos dedicada ao estudo e à disseminação de informações sobre as mudanças climáticas e seus efeitos –, caso não sejam adotadas medidas preventivas, o mar em várias regiões costeiras ao redor do mundo pode atingir níveis que comprometam as praias e a própria ocupação das cidades. 

Embora algumas projeções ainda possam parecer longínquas, como a perspectiva de que Santos comece a ser afetada apenas em 2050, vale lembrar que algumas cidades do litoral paulista já enfrentam impactos significativos do avanço do mar, como é o caso de São Vicente. Capitais como Rio de Janeiro (RJ), Fortaleza (CE), Salvador (BA), Recife (PE), São Luís (MA), Aracaju (SE), João Pessoa (PB), Natal (RN) e Maceió (AL) também estão entre as mais vulneráveis no Brasil. 

Com a COP30, o país tem grande chance de atuar na mitigação desse quadro. Mas, para tanto, é preciso irmos muito além de intenções. Em primeiro lugar, a implementação de medidas efetivas contra as mudanças climáticas tem de estar presente de maneira transversal em toda a pauta do evento, com foco nas ações que os países podem aplicar o mais rápido possível.  

No nosso caso, é fundamental um engajamento da indústria brasileira nessa direção, de modo que a conferência proporcione benefícios concretos em favor da descarbonização da produção fabril principalmente nos setores grandes emissores, como os setores de aço, vidro, cimento e químico. Esse engajamento pressupõe uma participação ativa do setor produtivo na apresentação e implantação de ações concretas em favor do netzero. Em paralelo, no evento temos a oportunidade de colocar sob os holofotes internacionais o nosso potencial de atendimento ao mercado nascente de produtos fabricados com baixas emissões de carbono, num cenário que também tem tudo para beneficiar o desenvolvimento socioeconômico do país. 

Em dias de mar calmo, avançamos sem preocupação para além da rebentação. Mas o cenário de tormenta que avança no horizonte não permite mais essa tranquilidade: precisamos aproveitar a COP30 para não deixar que a água sequer chegue na cintura.   

* Artigo originalmente publicado no jornal A Tribuna 

** Rosana Santos é diretora-executiva do Instituto E+ Transição Energética.

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